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A China se consolidou como um competidor feroz dos Estados Unidos na corrida pela liderança tecnológica, em um cenário que, até pouco tempo, parecia inimaginável.

Essa ascensão foi impulsionada, em grande parte, por gigantes ocidentais, como a Apple, que durante décadas transferiram sua produção e, consequentemente, seu conhecimento e capacidade de inovação para o país asiático.

O que era visto como uma estratégia de negócio brilhante — produzir a custos baixos para maximizar o lucro — se tornou uma via de mão dupla que fortaleceu a indústria chinesa e alimentou seus futuros rivais.

A estratégia chinesa não foi passiva. Pesquisadores como Kyle Chan, da Universidade de Princeton, explicam que Pequim conduziu um esforço deliberado para atrair e utilizar empresas como Apple, Volkswagen, Bosch e Samsung para aprimorar sua própria economia.

Enquanto companhias ocidentais buscavam mão de obra barata, a China usava a presença delas para sustentar seu desenvolvimento tecnológico e industrial.

Esse processo permitiu que o país desenvolvesse capacidades industriais, tecnológicas e humanas que hoje competem em escala global.

O jornalista Patrick McGee, em seu livro “Apple in China: The Capture of the World’s Greatest Company”, detalha como a decisão da Apple de fabricar mais de 90% de seus produtos no país asiático gerou lucros bilionários, mas também capacitou fabricantes chineses.

A fortuna e a produção sofisticada da Apple foram fundamentais para financiar e abastecer a cadeia de fornecedores chinesa, que, com o tempo, passou a substituir as fábricas estrangeiras na produção de componentes, como lentes, telas e até chips.

Uma análise do jornal japonês Nikkei Asia de 2024 aponta que 87% dos fornecedores da Apple têm fábricas na China.

A voracidade da concorrência entre as duas potências é exemplificada no setor de inteligência artificial.

Após anos de aparente liderança dos EUA com modelos como o ChatGPT, a China surpreendeu o mercado com o lançamento do DeepSeek em janeiro, um chatbot que, segundo seus criadores, custou uma fração do valor de seu concorrente americano.

O lançamento desafiou as restrições de exportação de chips avançados para IA impostas pelos EUA desde 2022, o que reforçou a percepção de que a China está rapidamente reduzindo a distância tecnológica.

O governo americano, por meio de sanções, tenta desacelerar o avanço chinês.

A inclusão da Huawei na “Lista de Entidades” em 2019, que a impediu de usar o sistema Android da Google, obrigou a empresa a desenvolver seu próprio sistema operacional e chips.

Kyle Chan defende que, embora as sanções sejam eficazes no curto prazo, elas acabam por impulsionar os esforços da China para desenvolver sua própria tecnologia e cadeia de fornecimento, tornando o país menos dependente do Ocidente.

As vantagens competitivas da China são claras.

Além do investimento estatal em setores estratégicos, o país se beneficia de uma concorrência interna feroz entre as empresas, que são apoiadas por governos regionais, e de sua vasta população, que fornece uma magnitude de dados sem precedentes para o desenvolvimento de tecnologias emergentes.

Han Shen Lin, diretor da consultoria The Asia Group na China, destaca que a capacidade de testar tecnologias em larga escala e o acesso a bancos de dados centralizados de pacientes, por exemplo, aceleraram o desenvolvimento em setores como o farmacêutico.

bandeira da China
Imagem: Pixabay

Enquanto a China busca fortalecer sua posição global, Han Shen Lin alerta para o risco de ficar isolada caso não consiga a colaboração de outros países.

Para evitar isso, o país expandiu sua influência no Sul Global, com projetos como a Iniciativa Cinturão e Rota, e tem buscado dominar os organismos que definem padrões em organizações multilaterais.

O resultado é um cenário de competição feroz, onde o centro da gravidade da indústria tecnológica está em constante deslocamento.

Fonte: G1



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