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Estrear no gênero RPG já é difícil. Fazer isso dialogando abertamente com clássicos e, ainda assim, construir identidade própria é mais raro ainda. Clair Obscur: Expedition 33, primeiro jogo do estúdio francês Sandfall, consegue exatamente isso e vai além: o título foi consagrado como o Jogo do Ano (Game of the Year) de 2025.

Inspirado por grandes JRPGs modernos e clássicos, o título não apenas homenageia suas referências como as transforma em algo autoral, coeso e emocionalmente marcante. O resultado é uma das experiências mais singulares do gênero nos últimos anos.

A premissa já estabelece o tom melancólico. No mundo de Lumiere, uma entidade conhecida como The Paintress pinta, ano após ano, um número em uma torre distante. Esse número representa a idade máxima que as pessoas alcançarão antes de simplesmente desaparecer.

Você lidera os sobreviventes da Expedição 33, mais uma tentativa desesperada de impedir esse ciclo (todas as anteriores falharam).

A sensação constante de urgência, luto e sacrifício permeia toda a narrativa, criando um envolvimento quase imediato com o destino desse mundo condenado.

A campanha principal dura cerca de 35 horas, um tempo enxuto para os padrões do gênero, mas extremamente bem aproveitado. Clair Obscur evita enrolação, exposição excessiva e “missões de preenchimento”.

A história avança de forma natural, revelando personagens por meio de diálogos, expressões e pequenas interações. Existe menos espaço para respiro, mas a escolha reforça a tensão narrativa. É um RPG que respeita o tempo do jogador sem sacrificar profundidade.

O sistema de combate é, sem exagero, um dos grandes destaques. Em turnos, sim, mas com um forte componente ativo.

Durante ataques inimigos, você precisa desviar, pular e aparar golpes em tempo real, prestando atenção a pistas visuais e sonoras.

O resultado lembra uma mistura improvável, porém funcional, de Persona, Mario RPG, Like a Dragon e até Sekiro.

A precisão exigida, especialmente em chefes, transforma cada batalha em um exercício de ritmo e concentração. Errar frustra. Acertar recompensa como poucos jogos do gênero conseguem.

Cada personagem possui mecânicas próprias, o que evita qualquer sensação de repetição. Há quem acumule cargas, quem trabalhe com elementos combinados, quem alterne posturas e até personagens que brincam com sistemas de cartas ou escalas de estilo.

Isso cria uma identidade clara para cada membro do grupo e exige planejamento constante. O jogo ainda adiciona uma camada estratégica com os Pictos, equipamentos que modificam regras fundamentais do combate e permitem builds profundas por meio do sistema de Lumina.

A dificuldade começa baixa, quase enganosa, mas cresce de forma inteligente. Inimigos passam a misturar padrões, status negativos e novas exigências de execução, mantendo o combate sempre estimulante.

O jogo permite “quebrar” seus sistemas se você for criativo o bastante, mas nunca de forma trivial ou explorável demais.

Fora das batalhas, Clair Obscur aposta em um overworld clássico, com mapa estilizado, áreas opcionais, segredos e locais que só se tornam acessíveis com novas habilidades, um aceno direto aos RPGs da era 16-bit e PlayStation.

A exploração recompensa curiosidade, seja com superbosses, minigames ou fragmentos narrativos adicionais, que podem somar cerca de 20 horas extras.

Narrativamente, o jogo aborda temas pesados como mortalidade, luto, legado e o perigo de se perder na própria dor.

As atuações de voz são excepcionais e ajudam a dar peso emocional aos diálogos, que soam naturais e humanos. Há momentos de leveza e humor, principalmente com os excêntricos Gestrals, mas o tom geral se mantém mais próximo de uma tragédia teatral do que de um épico blockbuster.

Visualmente e musicalmente, Clair Obscur também impressiona. A estética bebe da Belle Époque, do teatro e das artes francesas, enquanto a trilha sonora transita entre música orquestral, ópera, rock sinfônico e ambientações etéreas, sempre com impacto emocional.

Veredito Clair Obscur: Expedition 33

Clair Obscur: Expedition 33 é um RPG que entende profundamente o que torna o gênero especial. Seu combate é criativo e viciante, sua narrativa é sincera e dolorosa, e sua identidade artística é clara do início ao fim.

Mesmo com pequenas inconsistências narrativas perto do final, o conjunto é forte o bastante para colocá-lo como um clássico moderno e um dos melhores RPGs de estreia dos últimos tempos.

Clair Obscur: Expedition 33
  • Desenvolvedora: Sandfall
  • Plataformas: PC (Steam, Epic Games Store), PlayStation 5 (PS5) e Xbox Series X|S
Positivo
  • 🏆 Jogo do Ano (GOTY 2025)
  • Identidade Própria
  • Narrativa Forte e Emocional
  • Duração Enxuta e Eficiente:
  • Sistema de Combate Inovador
  • Profundidade Tática
  • Dificuldade Crescente
  • Exploração Recompensadora
  • Atuações de Voz
  • Estilo Artístico e Musical
Negativo
  • Frustração no Combate
  • Inconsistências Narrativas
Nota 9


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